sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Ciências Humanas








 "Há uma crise geral das ciências do homem: todas elas se encontram esmagadas pelos próprios progressos, mesmo que isso seja devido apenas à acumulação de novos conhecimentos e à necessidade de um trabalho colectivo, cuja organização inteligente ainda está por estabelecer"         

                                                                                                Fernand Braudel


Como considera Maria do Céu Roldão “o aluno que não gosta (de História) perde, por isso, não só a oportunidade de aprender bem e agradavelmente, mas perde mais do que isso, (…) perde uma das possibilidades mais ricas e gratificantes de se entender como pessoa, de compreender a sociedade que é a sua no contexto multifacetado do mundo do seu tempo; de se posicionar com uma atitude crítica, curiosa e interessada face ao devir em que participa; perde alguma coisa essencial, não só à sua formação pessoal, mas também ao prazer de viver compreendendo”.

domingo, 15 de novembro de 2015

ESCOLA BÁSICAJÚLIO DINIS VÍRGULA GONDOMAR - SKTECH TEATRAL MULTIMÉDIA

Adulta Maria:
- Olá! Em que escola andas?
Jovem Nuno:
- Ando na escola básica Júlio Dinis, Gondomar
Adulta Maria:
- Essa é a de cima ou a de baixo?
Jovem Nuno:
- A de baixo, a que tem uma caixa bordeaux à entrada. É muito fixe!
Adulta Maria:
-Acredito. Eu andei na escola preparatória Júlio Dinis. Fui inaugurá-la. As aulas começaram a 9 de outubro de 1968. Funcionava onde é hoje a casa dos Linhos. Era só de raparigas. Os rapazes foram para a escola de cima que emprestou as instalações. Aquilo é que eram tempos. Quando convenci o meu pai a dar-me umas calças, fui chamada ao Diretor, Carlos Moreira, que me impediu de as levar para escola. Fiquei tristíssima, mas era assim, naquele tempo, os rapazes usavam calças e as raparigas saias.
Jovem Nuno:
- Era o tempo do Salazarismo, em que não havia liberdade, não era?
Adulta Maria:
- Já era o tempo da primavera marcelista. Marcelo Caetano tinha acabado de ascender ao poder em setembro, a tendência educativa era um pouco mais aberta do que em anos anteriores. Criou-se, na altura, o ensino preparatório do ensino secundário e a telescola, o ensino pela televisão para os jovens que não pudessem frequentar aquele ensino.
Jovem Nuno:
- Como assim?
Adulta Maria:
- Os transportes não eram fáceis e muita gente não se podia deslocar à escola. Teria, então, de frequentar locais mais próximos da sua residência, onde aprendiam através de aulas  transmitidas pela televisão!

Jovem Nuno:
- Que altamente! Isso nem era preciso sair de casa…
Adulta Maria:
- Claro que era, até porque pouca gente tinha televisão e nos centros da telescola havia um monitor.
Jovem Nuno:
- Ah, percebo.
Adulta Maria:
- …mas desviei-me do que te estava a contar: a Escola Júlio Dinis funcionou em duas secções: de meninas, na rua Dr. Oliveira Salazar, e de meninos na Escola Industrial, até 1973. Nesta data, fica construída a nova escola num local onde tinha funcionado o campo do Sport Clube de Gondomar!
Jovem Nuno:
- Então ficaram sem o campo?
Adulta Maria :
- Não, mudaram-no para o sítio onde estão hoje, e melhoram as instalações.
Jovem Nuno:
- Ah, já sei, essa escola tinha vários pavilhões e jardins interiores.
Adulta Maria:
-Essa mesmo!
Jovem Nuno
- Fui lá com os meus pais no dia das eleições!
Adulta Maria:
- É, lá funcionavam sempre todas as secções de voto de S. Cosme, fizeram-me muitas reuniões políticas e a grande feira de Gondomar, a Agrindústria, geralmente por altura do Rosário.
Em 1974, deixou de se chamar Júlio Dinis e passou a denominar-se Escola Preparatória de Gondomar.
Jovem Nuno:
- Este ano voltou a chamar-se Júlio Dinis, mas eu não sei porquê… Adulta Maria:
        
- Júlio Dinis é um romancista importante do século XIX que escreveu várias obras de poesia, peças de teatro, ensaios literários e romances. Entre estes últimos, As Pupilas do Senhor Reitor; A morgadinha dos Canaviais, Uma família Inglesa e outras que deves gostar de ler porque, apesar de se passarem em cenários campestres reais e referência à política e vida da época, têm sempre histórias muito românticas, amores difíceis de concretização!
Jovem Nuno:
- Verdadeiras telenovelas de hoje?...
Adulta Maria:
- A brincar que o digas, se forem de qualidade!
Adulta Maria:
Júlio Dinis é o pseudónimo literário mais conhecido de Joaquim Guilherme Gomes Coelho que nasceu no Porto, a 14 de novembro de 1839 e morreu a 12 de setembro de 1871, na mesma cidade.
Formou-se em Medicina, mas foi um apaixonado escritor. As suas obras inscrevem-se na literatura de transição, entre o fim do Romantismo e o início do Realismo.
Como muita gente na sua época, Júlio Dinis foi atacado pela tuberculose e procurou refúgio no campo. Entre essas estadas de cura é tradição referir Fânzeres.
Jovem Nuno:
- Eu ouvi dizer que as Pupilas do Sr. Reitor foram inspiradas no Reitor de Fânzeres.
Adulta Maria
- Sim, há essa tese, mas não me parece. Ele era amigo de um padre de Fânzeres, mas quando lá foi passar um tempo já as Pupilas do Sr. Reitor tinham sido publicadas. É natural que a paisagem fanzerense  e a família de Montezelo o tivesse inspirado na redação de Os Fidalgos da Casa Mourisca.
Narrador Alberto:

No capítulo XI dos Fidalgos da Casa Mourisca, descreve uma casa que poderia ser muito fanzerense:


 “ aqui um monte de rama de pinheiro além duas ou três rimas de achas, acolá um tronco de laranjeiras partido, uma mó de moinho, dois carros desaparelhados, dornas, arados, pipas, canastras, escadas de mão, e várias outros utensílios de lavoura e de uso doméstico”.


Na cozinha ”longos espreguiceiros ao longo das paredes, no alto prateleiros pejados de louça nacional, de panelas e alguidares; nas traves os cabos de cebolas, no fumeiro a bem corada pá de presunto; o amplo forno vomitava labaredas pela boca escancarada e a cada instante engolia as novas e enormes doses de lenha que lhe ministravam; na masseira fumegava já da farinha ainda não levedada para a fornada da semana; e nela os braços valentes e roliços de duas frescas moças do campo enterravam-se até aos cotovelos”.


Segue-se a fórmula típica do pão que se leva a cozer.
Mariana e Beatriz vestidas de camponesa atravessam o palco com uma masseira com farinha a levedar. Fazem um cruz na massa e dizem ao mesmo tempo:
“S. Vicente te acrescente
S. Mamede te levede”


( remeiras posicionam-se no palco).
Narrador Alberto
Também é certo que Júlio Dinis descreve a marginal do rio Douro, entre o Porto e Valbom, no passeio de uma personagem de “Um família Inglesa”, Manuel Quintino:
( Manuel Quintino- Gonçalves - entra em cena e vai olhando o que que passa no palco, vai de um lado ao outro e pára do lado oposto observando a cena)
Narrador Alberto declama:
“ A primeira diversão operou-a só à vista do mercado de peixe, na ribeira.


As lanchas valboeiras tinham, naquele instante, chegado ao cais. As regateiras, os compradores particulares e os pescadores que vendiam, animavam o mercado com o movimento e vozearia.”


“Este espetáculo, cheio de vida comercial, não achou indiferente Manuel Quintino. Agradava-lhe aquele tráfego; examinava com olhos conhecedores a excelência do peixe, e informava-se curioso dos preços que regulavam o mercado.
(Manuel Quintino – Gonçalves-  vem até meio da cena e diz)
- Não há nada para o arranjo doméstico, como a pescada. É o peixe mais inocente que há. Com razão lhe chamam a galinha-do-mar. “

(Peixeira Beatriz apregoa o peixe):
- Olha a rica pescada fresquinha da linha.
Peixeira Mariana:
- Olha a sardinha de Espinho a saltar! Ó freguesa merque, leve  pescada que é galinha!

Narrador Alberto:
“ Chegou à quinta chamada da China – um dos passeios favoritos das classes populares portuenses.

 (Coreografia: Pessoas passam. Barqueiras de Avintes remam- Canção do mar-instrumental)

Narrador Alberto:
Desciam a rampa, que antecede o portão, alguns bandos de gente do povo, rindo, cantando, em plena festa; iam em direção ao rio. As barqueiras de Avintes aproximavam os barcos da margem para os receber; outras, ainda a grande distância, chamavam, com toda a força daqueles pulmões robustos, as pessoas que vinham por terra. Cruzavam-se os barcos, movidos por vigorosos braços destas engraçadas e joviais remeiras, e carregados com os frequentadores das diversões campestres do Areinho e da pesca do sável. Tudo era riso e cantigas no rio.

Peixeira Beatriz:
- Olha o sável que bibo, bibinho!
Peixeira Mariana:
Que bom que é fritinho de sabolada!

( Um homem desce a tocar cavaquinho- Tiago Sampaio)
Barqueira Alexandra apregoa:

Embarque freguês lá pró outro lado!
Barca não tereis linda como esta.
A moça solteira cá deste lugar
É afoita e brejeira


A cantar e dançar
Que dança tão linda
Mesmo à nossa moda
Que volta ligeira
Certinha na roda!

Narrador Alberto:
Manuel Quintino via tudo isto, e escutava entretido o canto de uma barqueira, que dizia:
( Manuel Quinteiro, Gonçalves vai de um lado ao outro do palco a observar tudo o que se passa)
(Barqueira Alexandra canta música popular:)
As riquezas deste mundo
Para mim não têm valor;
Eu sou rica dos teus braços
Eu sou rica do teu amor.

A cantar e dançar
Que dança tão linda
Mesmo à nossa moda
Que volta ligeira
Certinha na roda!

Jovem Nuno:
Ah! Agora percebo como alguém se lembrou de nomear Júlio Dinis como patrono da primeira escola do Ciclo Preparatório de Gondomar, é justo que a Escola Básica de Gondomar, que lhe deu continuação, retome o seu nome, homenageando um autor que soube descrever a realidade do seu tempo tão cheio de contradições, como aliás o nosso, e, neste sentido, tão atual.

Todos:
Viva a Escola Básica Júlio Dinis vírgula Gondomar!