No
capítulo XI dos Fidalgos da Casa Mourisca, Júlio Dinis descreve uma casa que poderia ser
muito bem fanzerense:
“ aqui um monte de rama de pinheiro além duas
ou três rimas de achas, acolá um tronco de laranjeiras partido, uma mó de
moinho, dois carros desaparelhados, dornas, arados, pipas, canastras, escadas
de mão, e várias outros utensílios de lavoura e de uso doméstico”.
Na
cozinha ”longos espreguiceiros ao longo das paredes, no alto prateleiros
pejados de louça nacional, de panelas e alguidares; nas traves os cabos de
cebolas, no fumeiro a bem corada pá de presunto; o amplo forno vomitava
labaredas pela boca escancarada e a cada instante engolia as novas e enormes
doses de lenha que lhe ministravam; na masseira fumegava já da farinha ainda
não levedada para a fornada da semana; e nela os braços valentes e roliços de
duas frescas moças do campo enterravam-se até aos cotovelos”.
Segue-se
a fórmula típica do pão que se leva a cozer:
“S.
Vicente te acrescente
S.
Mamede te levede”
No
capítulo XIII, Júlio Dinis descreve um caminho que bem poderia localizar-se
numa qualquer aldeia no verão, porque não em Fânzeres?
“A
companhia foi seguindo os acidentados caminhos da aldeia, cantando, saltando,
pondo em confusão as lavadeiras moças que ensaboavam nas presas, abraçando à
força na estrada as raparigas que, vergadas sob molhos de erva ou de milho
cortado, mal lhes podiam fugir; visitando todas as tabernas, fazendo correrias
a galinhas, porcos ou vacas que se lhes deparavam na passagem, calcando campos
e escalando muros com o desassombro de senhores.”
No
capítulo XIV, fala-nos do brasão enegrecido dum solar arruinado.
Na verdade, neste solar onde vivia Joaquim Araújo de Rangel, alferes, fidalgo
da Casa Real, vereador da Câmara do Porto dotado de um notável espírito
poético, mas ideal conservador, Miguelista, está presente na assinatura da
Convenção de Évora-Monte.
A quinta de Montezelo está, na verdade, nesta
altura, a precisar de remodelações, que não são regateadas, mas feitas com
recurso a hipotecas e outras operações bancárias.
“Os
Fidalgos da Casa Mourisca” refletem as lutas entre liberais regeneradores e
outras forças conservadoras. Aí, Fr. Januário é um administrador que amaldiçoa
as mudanças. O abade Pinto do Outeiro desconfia da política moderna.
No
romance, da janela do solar via-se luz na janela do agricultor Tomé. Na
verdade, na altura em que Júlio Dinis esteve em Fânzeres, existia uma casa de
lavoura de António Sousa Neves, que, com cerca de 37 anos, com espírito
empreendedor, emparcela veigas, alarga caminhos, compra terrenos para uma
escola, faz prosperar as três casas de lavoura que possui.