domingo, 31 de janeiro de 2016

31 de janeiro de 1891




Nas comemorações do Tricentenário da morte de Camões e a publicar no Diário de Notícias a 10 de junho de 1880, uma carta do próprio Camões na qual declara: “d’ante mão vos pago com novas d’esta, que não serão más no fundo de uma arca para aviso de alguns aventureiros que cuidam que todo o mato é oregãos e não sabem que cá e lá más fadas ha.” E prossegue referindo-se a “essa terra” da qual partiu “como quem o fazia para o outro mundo”, deixando para trás “quantas esperanças”, que se revelaram enganadoras, e um quadro em que “não ficasse pedra sobre pedra”, já se patenteia todo o clima de descontentamento contra a Monarquia.
O descontentamento exacerba-se face à resposta dada ao Ultimatum Inglês, em 1890,  que leva os Republicanos a cobrirem de luto a estátua de Camões.

No Porto, o clima revolucionário congrega-se na Liga Patriótica do Norte, fundada a 26 de janeiro de 1890, logo a seguir ao ultimato. Presidida - a convite do monárquico Luís de Magalhães - pelo poeta socialista Antero de Quental, então radicado em Vila do Conde, a LPN reunia monárquicos e republicanos, irmanados no repúdio ao ultraje inglês e na ambição de recuperação de um país mergulhado em grave crise política, económica e social. 
Proclama Antero: “Portugal expia com a amargura deste momento de humilhação e ansiedade de quarenta anos de egoísmo, de imprevidência e de relaxamento dos costumes políticos, quarenta anos de paz profunda que uma sorte raríssima nos concedeu e que só soubemos malbaratar na intriga, na vaidade, no gozo material, em vez de os aproveitar no trabalho, na reforma das instituições e no progresso das ideias".

Um ano depois, planeia-se, mesmo, uma rebelião. O directório do Partido Republicano Português, liderado por Elias Garcia, mostrara-se favorável à preparação de um movimento insurrecional.



Entretanto, no Porto, quando chega a ordem de transferência de alguns oficiais e sargentos, precipita-se a vontade de insurreição quase generalizada. O capitão António Amaral Leitão, foi o líder deste levantamento. Outros nomes ligados a este levantamento foram: Sampaio Bruno, João Chagas, Basílio Teles, Aurélio Pais dos Reis e o alferes Rodolfo Malheiro. Cerca das três e meia da madrugada de 31 de janeiro, o Batalhão de Caçadores 9, comandado por oficiais de baixa patente, posicionou-se junto do Regimento de Infantaria 18, no Campo de Santo Ovídio (atual Praça da República). Já que o coronel Meneses de Lencastre, comandante de Infantaria 18, partidário da revolta, mas sentindo a precipitação dos acontecimentos, decidiu manter-se neutral e não deixar sair os seus homens. O Alferes o Malheiro assumiu o comando.
O Regimento de Infantaria 10 e uma Companhia da Guarda Fiscal, sob o comando do tenente Coelho posicionaram-se junto da Cadeia da Relação.
Às seis horas, os cerca de 800 amotinados desceram a Rua do Almada e tomaram posições na Praça de D. Pedro, (atual Praça da Liberdade) em frente do antigo edifício da Câmara Municipal. O ator Carlos Verdial leu o discurso escrito pelo Dr. Alves Veiga, responsável civil do movimento, proclamando a República em nome do Governo Provisório elencando os nomes que o compunham. A bandeira foi hasteada, às sete da manhã, depois de Alves da Veiga ter pedido que fossem buscar a do Centro Democrático Federal 15 de Novembro, uma bandeira verde e vermelha, que aludia à implantação da República no Brasil em 1889.





Houve foguetes e a fanfarra militar tocou A Portuguesa.



                                Proclamação da República. Texto lido por Carlos Verdial



                                Bandeira utilizada pelos revolucionários do 31 de janeiro que pertencia ao Centro Democrático Federal 15 de novembro.











Edifício do  Centro Democrático Federal 15 de novembro, na Praça dos Poveiros, hoje


Praça dos Poveiros, hoje






Entusiasmada, a multidão subiu a Rua de Santo António (hoje 31 de Janeiro), tencionando tomar a estação dos Correios e Telégrafos, situada na Praça da Batalha. Não contava com a Guarda Municipal,  junto ao escadório da Igreja de Santo Ildefonso, que abriu fogo de metralhadora sobre a multidão, causando vítimas entre os militares e os civis.



                                          Rua de Santo António








Placa da Rua 31 de janeiro












Os revoltosos que tentaram voltar pelas ruas laterais à praça de D. Pedro, sofreram, aí, com a bateria de artilharia da Serra do Pilar que disparava sobre o edifício dos Paços do Concelho. Morreram 12 pessoas e cerca de 40 ficaram feridas.















Às nove da manhã, o movimento estava derrotado e os seus responsáveis em fuga. Os julgamentos processaram-se em navios da Armada, fundeados ao largo de Leixões. Mais de cinco centenas de militares e numerosos civis compareceram a Conselho de Guerra. Houve duas centenas de condenações, com penas que oscilaram entre os 18 meses e os 15 anos de prisão.








Embora fracassado no plano militar, o movimento de 31 de Janeiro é tido como a grande semente da vencedora revolução republicana de 5 de outubro de 1910.
A revolução foi gorada porque, como explica Gaspar Martins Pereira em Da Liga Patriótica do Norte ao 31 de Janeiro  e já Sampaio Bruno admitira, algum tempo depois da revolta,  no Manifesto dos Emigrados do 31 de Janeiro, devido a imprevisibilidade de aspetos fortuitos, de cobardias e de traições. Teria havido, também, a indiscrição e falta de tato político de Santos Cardoso, director do Jornal A Justiça Portuguesa, encarregado da ligação aos militares. Também poderia ser equacionada a posição do Diretório Republicano e a falta de solidariedade ativa da Maçonaria. Por último, foram cometidos muitos os erros táticos numa operação militar, muito precipitada e sem a necessária planificação.
Alves da Veiga e Basílio Teles eram, aliás, contrários à antecipação da revolta e tentaram, sem êxito, adiá-la. Por outro lado, as divergências no seio do Partido Republicano, aliadas a questões pessoais, como as existentes entre Homem Cristo e Santos Cardoso, diminuíram a base de apoio e probabilidades de êxito do levantamento militar.
Contudo, muitos confiavam na vitória portuense.
Cerca de dois meses antes do 31 de Janeiro, Teófilo Braga escrevia a Santos Cardoso, invocando a Revolução Liberal de 1820, mostrava-se convicto de que a revolução republicana também iria triunfar no Porto. "Se estivermos à espera do levantamento de Lisboa - dizia o futuro primeiro chefe de um governo republicano - nunca ele virá, porque esta gente aqui é timorata e cheia de conveniências, tem medo da polícia, da guarda municipal (...) além disso, os dirigentes são elementos velhos que tudo empatam. A revolução do Porto é que pode acordar esta gente...".
Para Antero de Quental que após o do 31 de Janeiro regressa aos Açores, suicidando-se em setembro, 1891 - o maior inimigo não era o inglês: " Somos nós mesmo, e só um falso patriotismo, falso e criminosamente vaidoso, pode afirmar o contrário. Declamar contra a Inglaterra é fácil: emendar os defeitos da nossa vida nacional será mais difícil (...) Portugal, ou se reformará, política, intelectual e moralmente, ou deixará de existir. Mas a reforma, para ser efetiva e fecunda, deve partir de dentro, do mais fundo do nosso ser coletivo: deve ser antes de tudo uma reforma dos sentimentos e dos costumes. Enganam-se os que julgam garantir o futuro e assegurar a nacionalidade com meios exteriores e materiais, com armamentos e alarde de força militar ".


Numa reflexão que nos traz ao presente, Guerra Junqueiro desafia-nos "A revolução impõe-se. Hoje, quem diz pátria, diz república. Não uma república doutrinária, estupidamente jacobina, mas uma república larga, franca, nacional, onde caibam todos."








Fontes:

   http://aviagemdosargonautas.net/2012/01/31/diario-de-bordo-de-31-de-janeiro-de-2012/


      https://picasaweb.google.com/franciscodeparanhos/PasseiosDeOutono2010CentrosRepublica    nosLocaisDeConspiracaoEHomenagemAosHerois#5521343743391196914

https://picasaweb.google.com/franciscodeparanhos/PasseiosDaPrimavera20104#5475702442123880306