. Os
R(e) encontros com a escola, no seu
conjunto, ajudaram à necessidade da minha reflexão que se centrava, ao fim e ao
cabo no tema: como manter a chama, depois de 33 anos de serviço e continuar a
lutar para que os alunos aprendam mais a pensar do que memorizar; como lidar
com aqueles que não gostam da escola em geral e da disciplina de História em
particular.
O
professor Marçal Grilo contextualizando os problemas na sociedade atual deu-me
a dimensão histórica para situar o problema:
Numa altura em que a crise financeira pôs em
causa a omnipotência dos mercados, os cidadãos nunca tiveram tão pouca
confiança no Estado. Na verdade, à máxima «menos Estado» neoliberal”, Philippe
Aghion, na obra Repenser l'État -
Pour une nouvelle social-démocratie, responde «mais Estado, de outra forma», lembra
Marçal Grilo; o que promove o
investimento do Estado no crescimento e na inovação, é, ao fim e ao cabo “um
Estado garante do contrato social” roussouniano”, um Estado protetor, num mundo
mais incerto, direcionando a sua ação para a educação e a doença. Marçal Grilo
frisa: “passámos a ser uma sociedade sem valores. Muito poucos de nós
respeitam o sentido da ética” Ora perante estas
premissas recolocam-se as questões: “o que os meus alunos devem aprender?. O
que devo ensinar”?.
Marçal Grilo, ministro do governo de Guterres,
defendeu a política implementada já na altura: a necessidade de um bom ensino
pré escolar na formação de hábitos e organização de estudo, a formação de uma
mentalidade que o estudo implica sacrifício, tempo em tarefa. Hoje, continua a
defender que é mais importante formar atitudes e comportamentos do que os
conhecimentos. Formar para a mudança será, hoje, fundamental, num mundo em
constante mutação; levar os alunos a ler, interpretar e refletir sobre o que lêem.
Nesta perspetiva, a missão da escola num constante diálogo com os pais é a de
guia dos jovens, daí a urgência de formações abrangentes durante o maior
período de tempo possível capaz de propiciar adaptações mais facilitadoras quer
opções mais cimentadas. Ora aqui está, então, o meu papel, formar o jovem numa
perspetiva de cidadão reflexivo e interventivo, sendo eu, o mais possível uma referência
profissional, cultural e moral. Estas premissas foram defendidas por muitos
outros palestrantes ao longo dos reencontros. Numa sociedade em que as
políticas contraditórias se sucedem, é fundamental encontrar espaço para as
aprendizagens significativas, a articulação vertical entre ciclos, a articulação horizontal das matérias. Como bem
disse Manuel Rangel: “ Somos mediadores, adaptadores do currículo e
profissionais reflexivos sobre a forma como o currículo passa para as
crianças”. Plenamente de acordo. Baseando-se em Perrenoud, Rui Trindade afirma
que os alunos precisam de andaimar os seus percursos de aprendizagem.
Entretanto, o ministério obriga-me, através das “Metas Curriculares”a
desenvolver matéria de História, no 7º e 8º ano cumprindo 41 objetivos gerais e
372 objetivos operacionais de conteúdo (descritores), não processuais, podendo
destinar cerca de dezassete minutos a cada um deles à média horária de 17 minutos, o que dará cerca de 5,3 objectivos por cada
aula útil [1] e tudo muito matematicamente cumprido, porque no
final do ano, tenho que prestar contas do meu desempenho junto da Direção da
escola. Perante isto, o que devo ensinar aos alunos? 80% dos objetivos estão
compreendidos no domínio do conhecimento e compreensão, restando-me 10% para a
aplicação e outros 10% a distribuir pela análise, síntese e avaliação, num
programa que remonta a 1991.
E cá vou eu implementar a cultura da exigência,
com certeza, já que fui para esta profissão mais para seguir aquilo que
considerava a minha missão/vocação. Concordo plenamente que a auto avaliação, a
permanente reflexão é muito mais importante do que a avaliação burocrática.
É nesta auto avaliação que situo a
necessidade de motivar os alunos, que hoje habitam escolas que podem ser até
novas, (muito diferentes das ergonomicamente adaptadas às suas funções,
apontadas por Cesário Moreira) mas são literalmente cinzentas e mal iluminadas,
aos magotes, cabeça da frente a esconder aos de trás a informação a reter, a
imagem que se pretendia pudessem observar com pormenor. Neste
contexto, resta sublinhar que, para que haja ensino -
aprendizagem é necessário que o professor consiga motivar os seus
alunos para a aprendizagem, entenda quebrar as suas defesas, no que respeita as atribuições internas e externas, a alta ou baixa auto estima e adeque a sua linguagem a tais
pressupostos. Estamos certamente perante o fator
professor/ aluno e a sua capacidade de tornar interessante ou desafiante,
aprender.
Poderíamos, ainda, introduzir outra variável, que nos dias de
hoje é perturbada por fatores externos que influenciam a própria motivação do
docente. Com efeito, é necessário que o professor goste do que ensina e reflita na melhor forma de levar os alunos que deve
conhecer bem, a apreenderem os conteúdos a lecionar, certamente muito mais fácil com métodos ativos e de “aprender
fazendo”. Mas, nas circunstâncias atuais, este ensino terá que utilizar alguns
dos métodos tradicionais adaptados a um toque de modernidade. Alguns modelos tradicionais de aprendizagem das
ciências, com base nas perspetivas de autores como Ausubel, Piaget ou
Driver, defendem situações de
aprendizagem estruturadas adaptados aos conhecimentos prévios ou estimulando o
conflito cognitivo e a sua mudança concetual. Estes métodos que
também valorizam a atividade dos alunos, preconizam que o ensino parta de uma avaliação diagnóstica,
para que possa ser adaptado à estrutura cognitiva preexistente no aluno, para
que esta funcione de ancoradora para outras aprendizagens, ou seja, uma
aprendizagem significativa com organizadores de ancoragem avançados ou índices
de organização introduzidos por uma comunicação do que os alunos devem
adquirir. Estas estratégias pretendem já fugir da memorização maquinal ao
exigir que o aluno retenha a ideia e a relacione com os conhecimentos já
adquiridos, procurando o seu sentido. De forma semelhante poderemos
socorrer-nos de Vigotsky e a zona de desenvolvimento próximo.
No entanto, uns e
outros descuram a dimensão afectiva
enfatizada por António Damásio. [2]
Neste campo, partindo das
lembranças de Marina Serra Lemos, o professor deverá, ainda, estar atento ao
estilo motivacional de cada aluno: os alunos socialmente motivados, que reagem
melhor em situações de aprendizagem em grupo e os curiosos em situações de
resolução de problemas. Desta forma, deveremos questionar as estratégias
uniformes já que são aplicadas a características individuais diversas,
utilizando uma diversidade de processos pedagógicos que visem promover a motivação (intrínseca, extrínseca
ou combinada) do maior número de alunos. Neste percurso, a definição de
objetivos e avaliação dos progressos no sentido de os atingir será relevante. As disposições, hábitos e crenças devem ser
tidas em linha de conta já que condicionam o envolvimento nas tarefas.
Os últimos anos têm-me
levado a pensar porque é que bons alunos falham, quando outros têm sucesso.
Marina Serra releva a questão da confiança na capacidade, para atingir
resultados desejados, daí a necessidade de encorajamento dos alunos a
estabelecer objetivos, facilitar vivência de experiências emocionais positivas
e estimular o desejo e a vontade de aprender.
Segundo Pocinho et al. (2007)
e Canavarro (1999) [3]estar
motivado para aprender pressupõe a
utilização de estratégias de
autorregulação ou de metacognição. Desta forma, a motivação é fundamental para
se atingirem aprendizagens significativas. Também o autoconhecimento por parte
do aluno, a autoestima positiva, vai permitir o sucesso.
Deste mesmo domínio, poderíamos inserir a palestra do professor
Joaquim Azevedo com quem trabalhei, no início da sua caminhada pela defesa do
ensino profissional, nos CTL, em Lordelo, Paredes, tendo eu própria
experienciado, a diferença de motivação de um aluno inserido no ensino regular
e um aluno inserido no ensino “profissional de marcenaria, talha, palhinha ou
trabalho do couro”.
Joaquim Azevedo chama a
atenção para o facto da conceção de ensino profissional como currículo para os
menos capazes, estar errada, à partida, já que hoje sabemos que as inteligências
são múltiplas e um curso profissional de mecânica não terá menos valor do que
um científico tecnológico. Torna-se, então, premente reorientar a educação para
a diferença, mostrando os benefícios que poderão advir para toda a sociedade.
Os alunos devem é ser
selecionados pelas suas capacidades, depois de um período de aprendizagem
generalista e não como solução para quem não tem apetência pela escola em
geral.
Como o citado palestrante,
penso que seguir um curso de música desenvolve tanto o ser humano na sua
totalidade como um de Matemática, sobretudo se despertar a curiosidade para o que rodeia o Homem. A hierarquia das disciplinas é uma questão de
moda, já que sabemos que hoje as ciências e as tecnologias são as mais bem
vistas e o ensino não pode estar sujeito a esses juízos de valor.
Os alunos dos cursos
profissionais para seu bem e dos professores que ministram estes cursos devem
ser alunos motivados para uma determinada aprendizagem, embora mais prática.
Estes alunos são tão úteis à sociedade e ao mundo do trabalho como os seus
colegas dos cursos científico-tecnológico, humanístico ou artes. Neste aspeto,
a comunidade local deveria ser chamada a colaborar em parceria com a escola, no
sentido de melhor formar a nível prático e encontrar saída profissionais
estimulantes.
As estratégias para desenvolver as capacidades destes
alunos terão necessariamente que ser diferentes, mas esta diferença não é
segregadora, se for exigente nos seus objetivos – formar o profissional numa
determinada área; até porque citando o grande especialista neste tipo de
ensino, Joaquim Azevedo, a realidade produtiva e económica baseia-se no uso
intensivo do conhecimento e requer uma nova mão-de-obra, muito mais
qualificada, capaz de se adaptar com mais facilidade às mutações permanentes,
mais criativa e com mais capacidade de iniciativa própria “
Desta forma, é fundamental que o ensino
profissional dê a possibilidade aos seus alunos de prosseguir estudos
universitários seguindo as mesmas regras dos outros cursos.
Esta variante do ensino aponta para outra trave mestra defendida, também, por Marçal Grilo, a da autonomia das
escolas que gera, necessariamente responsabilidade. Se as escolas que têm
autonomia funcionam melhor porque têm a faculdade de tratar o que é difícil de
forma diferente é fundamental que qualquer escola faça a avaliação
diagnóstica dos seus alunos, para a
partir de uma liderança forte e um corpo docente estável possa definir um
projeto adequado às necessidades evidenciadas. Por isto tudo, concluo que tenho
que cumprir as diretrizes do ministério, mas sem descurar as minhas crenças
pessoais cimentadas ao longo de uma carreira já considerável e baseada nas
investigações e conclusões dos estudos que se vão fazendo.
Este
ciclo ajudou-me a pensar a escola de forma sustentada, a relembrar algumas das
leituras que tinha feito a fazer outras, vincando sempre a necessidade de não
deixar morrer muito do que foi conquistado com as pedagogias operacionalizadas
ao longo do século XX, redobrando a certeza, apesar da crise de valores e falta
de ética imperarem, na nossa sociedade, de que a educação do futuro terá que
incidir sobre a igualdade de oportunidades, adaptando-se a cada um segundo as suas necessidades.
[1] Luís Grosso, O regresso do
livro único - metas curriculares , Público, 21 de abril,
2013
[2]
Damásio, A. (2007). Porque é que as
ciências «moles» são «moles», in Despertar para a Ciência –
Novos
Ciclos de Conferências, Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação
para a Ciência e a
Tecnologia
e Gradiva, pp. 151-152.
[3] Canavarro, J. (1999).
Ciência
e Sociedade. Coimbra: Quarteto Editora; Pocinho, M. et al. (2007). Atribuições
causais para o bom e fraco desempenho escolar: estudo com alunos do 3º ciclo do
ensino básico. Revista Psicologia, Educação e Cultura, Nº 2(11), pp.
1-11. In Motivação e aprendizagem: A
didática da Economia no ensino secundário – um estudo de caso- http://www.ore.org.pt/filesobservatorio/pdf/mestradopedromucharreira.pdf,
13.11.2013