“ Para ser professor, também é preciso ter as
mãos purificadas. A toda a hora temos de tocar em flores. A toda a hora a
poesia nos visita.” (março, 30,
1949)
É bom este trabalho na escola que se inicia devgar com exames, revisão
de planificações e ansiedade face aos horários, face aos alunos, face aos
colegas e ao ministério. Por um lado, temos tempo para nos habituarmos, mas por
outro, a ansiedade vai-se intrometendo e complica a postura serena. Como
sistema regulador, face às planificações, aos alunos e aos colegas, a reflexão
conjunta ajuda a tomar decisões mais acertadas aplicadas aos contextos. No
entanto, no que diz respeito ao ministério e aos horários a situação
complica-se. Enquanto uns esperam umas malfadadas listas que os coloquem em
determinada escola, outros esperam por essas colocações para que os seus
horários sejam ultimados para que, depois, possam organizar a sua vida familiar
que muda de ano para ano. E haja emprego, claro!
Ainda hoje a arrumar as gavetas apareceu um recibo de vencimento de
2006, o ordenado base era menor, mas o ordenado líquido substancialmente maior,
para pagar produtos que ou encareceram ou se tornaram mais necessários, à medida
que a idade vai passando, como sejam, os medicamentos. Mas, como costuma dizer
um amigo meu, haja saúde. É preciso ser otimista, porque o pessimismo entranha-se.
A uns dias de recomeçar o trabalho com os meus alunos, gostaria de lhes
poder dar mais oportunidade para pensar. O meu filho, adolescente muito crítico,
queixa-se que a escola só se preocupa com a reprodução. Os professores
recomendam que se compreendam as coisas e se tenha espírito crítico, mas depois, cotam mais as respostas mais próximas do que foi ensinado. Enfim, pondo de lado
os exageros próprios da idade, não deixa de ter alguma razão. Não estamos nós
preocupadas em como ensinar a pensar, cumprindo metas e o programa, uma tarefa
quase só de génios?
Convocando de novo Sebastião da Gama:
Convocando de novo Sebastião da Gama:
- A quem comunicarei o meu entusiasmo, se não falar entusiasmado, a
minha tristeza, se parecer que estou alegre, a minha necessidade de chegar
depressa, se der a mostrar que tenho muito tempo?” ( janeiro,14)
É que na verdade, é que eu, como Ariana Cosme, também tenho à minha
cabeceira o diário de Sebastião da Gama (1924-1952) e tal como ela
gostaria de comunicar aos meus alunos o mesmo que ele:
janeiro, 12, 1948
«O que eu quero principalmente é que vivam felizes».
Não lhes disse talvez estas palavras, mas foi isto o que eu quis dizer. No sumário, pus assim: «Conversa amena com os rapazes». E pedi, mais que tudo, uma coisa que eu costumo pedir aos meus alunos: lealdade. Lealdade para comigo, e lealdade de cada um para cada outro. Lealdade que não se limita a não enganar o professor ou o companheiro: lealdade activa, que nos leva, por exemplo, a contar abertamente os nossos pontos fracos ou a rir só quando temos vontade (e então rir mesmo, porque não é lealdade deixar então de rir) ou a não ajudar falsamente o companheiro.
«Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos».
Não acabei sem lhes fazer notar que «a aula é nossa». Que a todos cabe o direito de falar, desde que fale um de cada vez e não corte a palavra ao que está com ela."
«O que eu quero principalmente é que vivam felizes».
Não lhes disse talvez estas palavras, mas foi isto o que eu quis dizer. No sumário, pus assim: «Conversa amena com os rapazes». E pedi, mais que tudo, uma coisa que eu costumo pedir aos meus alunos: lealdade. Lealdade para comigo, e lealdade de cada um para cada outro. Lealdade que não se limita a não enganar o professor ou o companheiro: lealdade activa, que nos leva, por exemplo, a contar abertamente os nossos pontos fracos ou a rir só quando temos vontade (e então rir mesmo, porque não é lealdade deixar então de rir) ou a não ajudar falsamente o companheiro.
«Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos».
Não acabei sem lhes fazer notar que «a aula é nossa». Que a todos cabe o direito de falar, desde que fale um de cada vez e não corte a palavra ao que está com ela."